terça-feira, 24 de julho de 2012

SINGULAR

poeta mossoroense



Capaz de renunciar
O mundo dos objetos,
Procurei alcançar
Uma forma extrema de liberdade,
Atendendo à sua singularidade,
Recheada de rostos e cidades em movimento,
Cujo rastro de luz,
Se perde no horizonte sem fim,
Para reproduzirem as raízes que nos sustenta.


José Lima Dias Júnior

quarta-feira, 18 de julho de 2012

AVISO AOS NÁUFRAGOS

Paulo Leminski


Esta página, por exemplo,
não nasceu para ser lida.
Nasceu para ser pálida,
um mero plágio da Ilíada,
alguma coisa que cala,
folha que volta pro galho,
muito depois de caída.
Nasceu para ser praia,
quem sabe Andrômeda, Antártida
Himalaia, sílaba sentida,
nasceu para ser última
a que não nasceu ainda.
Palavras trazidas de longe
pelas águas do Nilo,
um dia, esta página, papiro,
vai ter que ser traduzida,
para o símbolo, para o sânscrito,
para todos os dialetos da Índia,
vai ter que dizer bom-dia
ao que só se diz ao pé do ouvido,
vai ter que ser a brusca pedra
onde alguém deixou cair o vidro.
Não é assim que é a vida?


(Leminski)

O poeta

sexta-feira, 13 de julho de 2012

O GUARDADOR DE REBANHOS II




                                       II

O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás…
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem…
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras…
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do mundo…
Creio no mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender…
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos…
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe por que ama, nem o que é amar…
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar…

Fernando Pessoa


segunda-feira, 9 de julho de 2012

DILATAÇÃO

Autora Mossoroense



Dilatados são os olhos que ardem
De dor e de medo
Vastas são as lágrimas
Das noites cálidas de desejo
Na solidão da alcova
Extensos são os sonhos impedidos
Protestados
Engolidos
Pela boca que emudece
Cruas palavras
Pronunciam a extensão do tempo que entorna
Insistente a construir muros
Estorvo
Dialético da vida encarcerada
Rangido persistente 
Mórbido
São vozes das portas que se fecham
Preso
Impossibilitado
Trancafiado com um (mal) dito cadeado da culpa.
Que universo conspire o “Não”   MEU DOCE PRISIONEIRO

Michelle Morais de Sousa