segunda-feira, 25 de abril de 2016

REGINA AZEVEDO




A autora


sinto muito não ser assim suave
você disse que aquele pássaro
era da cor do meu cabelo

mas ele era vermelho

e nosso amor está em algum lugar
entre o voo e a extinção da espécie

meu cabelo é laranja
laranja porque sou poeta

(e prefiro ter cara de poeta
a ser bonita)

você estava andando na rua
viu um pássaro
e lembrou do meu cabelo

isso diz muito sobre
seus olhos
esses, sim, vermelhos


                                                                          Regina Azevedo






quinta-feira, 21 de abril de 2016

ALEX MOURA




O Autor


Na discrepância
casual do destino
de um marginal
num mundo
socialmente corrompido
por seres
que deixaram
de ser humanos vivos
para serem bichos
nesse mundo distorcido
mortos na inconstância do momento
na boca
exalando excremento
e na mente
exaltando o pensamento
de crescer
e ser
na fossa dessa era
o tolete evidente


                                                                             Alex Moura





ARDOR




Iracema Macedo


Um oceano inteiro não basta
para calar no meu peito
este murmúrio
de tantas formas de ardor
tantas formas de estar banida e só
e não há terra ou chuva
que arrefeça
esta porção de mim
que trago cálida
essa porção de mim
que trago presa
esse meu coração cheio de vespas


                                                                             Iracema Macedo



domingo, 17 de abril de 2016

POEMINHA BÊBADO




Marcelino Freire


ele chega e me aperta
peito dentro do peito
ao meu pobre coração
fala mais de um segredo
engole a minha saliva
me sequestra um beijo

aí depois vem com desculpas
me diz no outro dia
"é que eu estava bêbado"

ele pula em meu pescoço
me lambe cheiro por cheiro
molha de nicotina
todos os meus pelos
na cama me ama e grita
que é homem e não tem medo

aí depois vem com desculpas
me diz no outro dia
"é que eu estava bêbado"

ele chega em meu ouvido
contorcido de desejo
come meu rabo o bandido
me humilha de joelhos
clama assim que eu chupe
cada um de seus dedos

aí depois vem com desculpas
me diz no outro dia
"é que eu estava bêbado"

seu merda filho da puta
desculpas desse tipo de novo
já disse que não aceito
porque mais bêbado do que eu
neste mundo não existe
nenhum outro sujeito


                                                                                Marcelino Freire




terça-feira, 5 de abril de 2016

ESPÁTULA


Carlos Gurgel




petrificado tempo
onde a pobreza
mais que pobreza

não se sustenta

metrificado tempo
onde a nobreza
mais que nobreza

não se inventa

delicado tempo
por onde a leveza da vida
não se remenda



                                                                            Carlos Gurgel





segunda-feira, 4 de abril de 2016

SOL NA CASA 5 E LUA NA CASA 3




Leonam Cunha


Não controlamos as angústias
com fita métrica. Na intenção
de aninhar, coser abraços,
gozar e amar com precipício, eu vou.
Eu e alguém - que não chega,
que não chega porra não chega não -
seriamos aquele terreno abandonado,
por onde as moscas sobrevoam,
e se sobrevive bem com paus
e espinhos. Não quero
que me olhes como se me fosses
ver de novo, como se pudéssemos
esquiar em vasto passado.
Eu e alguém - que não chega,
que não chega porra não chega não -
seríamos a fotografia
de uma ancha tragédia efêmera,
um novelo sem começo nem fim,
os ossos de dois fósseis mortos de prazer
descobertos no futuro da civilização.


     
                                                                             Leonam Cunha