segunda-feira, 30 de junho de 2014

FUGA


Poeta Paraibano 

Trem desgovernado fora dos trilhos
carregado de amor e pólvora nos ossos
Avião em queda livre para o abraço
cortando as órbitas dos olhares perdidos
Carro acelerado fazendo curvas perigosas
com um motorista embriagado berrando aos quatro cantos
Crianças correndo por imensos campos floridos
com papoulas nos lábios e insensatez na mente
Bombardeios orgásticos derrubando as leis das cidades
e preenchendo o vazio dos tempos cibernéticos
Cílios em slow motion
cortejando novos pulsares sacrossantos
Selvagens suando a cântaros
sinfonias de suspiros e deleites imprevistos
Línguas guerreando num beijo explosivo
Corpos que dançam a pura liberdade


                                                                          IkaRo MaxX


  

domingo, 29 de junho de 2014

CONSOLO NA PRAIA


Vamos, não chores.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.

O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.

Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis carro, navio, terra.
Não tens um cão.

Algumas palavras duras,
em voz mansa, te golpearam.
Nunca, nunca cicatrizam.
Mas, e o humor?

A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado
murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.

Tudo somado, devias
precipitar-se, de vez, nas águas.
Estas nu na areia, no vento...
Dorme meu filho.


                                                        Carlos Drummond de Andrade





segunda-feira, 23 de junho de 2014

TEMPOS ATRÁS


O silêncio convida-nos
a voltarmos atrás no tempo
e tentarmos compreender um mundo
onde a vida construída a partir do nada
fora decorada com uma moldura horizontal
a uma altura determinada,
de modo que as paredes da injustiça
parecessem menos altas.


                                                              José Lima Dias Júnior



COM AS DEVIDAS DESCULPAS

Poeta Paraibano

Embora eu vou
com teu retrato
de olhos insones
com a tua maneira
de perfumar silêncios
com a tua voz descalça
com teu laço no sapato
com a tua boca
na pronuncia de mim.
Embora eu vou
com as tuas mãos
a coçar minhas costas
com teus cabelos sujos
com tuas pernas
sendo pernas nas minhas.
Embora eu vou
embora com amor.

                                                                     Abraão Vitoriano




sexta-feira, 20 de junho de 2014

INCLINO-ME


Poeta Português

Inclino-me para a noite.
Para o som inextinguível do silêncio.
Para o fruto melancólico
d'uma luz suave, na doce penumbra
de me saber gente.

Penetro a luz com a boca violada.
Com os dentes rilhados de sol
como uma laranja espremida
no ventre da fantasia, tão ao
gosto d'uma língua circular,
onde tudo roda até ao âmago
das papilas que, enumeram
os poros um a um.

Inclino-me, e alguém me diz:
Vê, como o teu corpo é translúcido
na noite de todas as fábulas.
Como a loucura acede ao teu olhar
de violador de chamas reluzentes.
Ao centro nevrálgico, onde não
podes controlar o espasmo, e
te deixas fluir como um rio sedento
de mar, num abraço de morte desmedida
que paralisa o livre pensamento.
Como um fruto descascado pelo
gume do aço; ao qual só umas mãos
acesas iluminam o sumo derramado.


                                                              Joaquim Monteiro




quarta-feira, 18 de junho de 2014

OPERETA

Poeta Baiano


Não sei
se o ameaço
de morte
ou afago
seu corpo leitoso -
a noite, nesse instante,
segue ávida.

Não sei
se o ameaço
de vida
ou vou me embora
na solidão -
a noite, nesse instante,
segue bêbada.

Poderia alerta-lo
eu-não-sei-o-que.
Talvez o mesmo,
a dor, o amor -
a noite, nesse instante,
segue encantada.

A lógica noturna diz:
circulam falsidades
em muitos corações -
a noite, nesse instante,
segue sua incompletude.


                                                          Antonio Nahud



segunda-feira, 16 de junho de 2014

TORPOR I

Anchieta Rolim
Não sei mais
onde termina a pele
e começa o pano

são os meus dedos
ou o cigarro

O copo provocou
a extinção
dos meus lábios

E os pensamentos
são ou não
a realidade.

                                                                 Anchieta Rolim


domingo, 15 de junho de 2014

CASTORIADIS



Um bom pensamento a gente não esquece
Gruda na mente tipo chiclete liguento que liga
Fixa o gosto que se faz presente no desejo que ocupa
uma imagem mastigada com gosto de fruta retornando
Outra fruta do chão deitado para o céu caído no seu telhado
Repouso para a lua pousar sua luz.

                            Sobre o tempo?
                       Não é fácil de-escrever
               Inscrever, escrever o que tem sido
                   Só vendo, ter-sido, só sendo

                         Claudio Castoriadis

quinta-feira, 12 de junho de 2014

A CASA DO POETA

Sérgio Vaz


O endereço do poeta
não encontra-se no mapa
não é à esquerda
nem à direita, a sua casa.

Longe de tudo
e no meio do nada
ele tece seu papel.

Vive do que lhe dão:
sopa de letrinhas
e pedaços de pão.

O dinheiro?

Ele tira do comércio
da sua pequena lojinha
de asas de aluguel.

                                                                  Sérgio Vaz



terça-feira, 10 de junho de 2014

VINÍCIUS QUEIROZ




Lutar como um leão
em um dia desconhecido
montar em dragão
protegendo os amigos

nas provas da vida
missão a cumprir
batalhas diárias
não me deixam dormir

caminhando prossigo
sempre a sorrir
fazendo amigos
me faço existir. 


                                                                 Vinícius Queiroz

domingo, 8 de junho de 2014

ESCÁRNIO PERFUMADO

Cruz e Sousa
Quando no enleio
de receber umas notícias tuas,
vou-me ao correio,
que é lá no fim da mais cruel das ruas,

vendo tão fartas,
d'uma fartura que ninguém colige,
as mãos dos outros, de jornais e cartas
e as minhas, nuas - isso dói, me aflige...

E em tom de mofa,
julgo que tudo me escarnece, apoda,
ri, me apostrofa,

pois fico só e cabisbaixo, inerme,
a noite andar-me na cabeça, em roda,
mais humilhado que um mendigo, um verme...


                                                                      Cruz e Sousa



sábado, 7 de junho de 2014

COMPOSIÇÃO PARA NOITE DE SÁBADO

Poeta Potiguar

Entre as nuvens mais belas, as estrelas
e a metamorfose das quimeras.

A noite de sábado lembra logo uma lua aberta.
Um descampado ou uma praça,
o desapego das coisas tristes e voluntárias.

O dia comum,
de semana, urdido de trabalho sem poesia,
dia de mais valia (parece mais lobotomia).

Mas a espera do fim da tarde,
do sábado,
que precede a noite,
é terapia, é canção, é mantra que arde!

A sintaxe do sábado é arte!


                                                                    Yuri Hícaro





sexta-feira, 6 de junho de 2014

OBJETO DE AMAR

Adélia Prado
De tal ordem é e tão precioso
o que devo dizer-lhes
que não posso guarda-lo
sem que me oprima a sensação de um roubo:
cu é lindo!

Fazei o que puderdes com essa dádiva.
Quanto a mim dou graças
pelo que agora sei
e, mais que perdoo, eu amo.

                                                                         Adélia Prado



terça-feira, 3 de junho de 2014

DIÓGENES DA CUNHA LIMA

Diógenes da Cunha Lima
Quantos rios
são esse rio?
Quantas formas
espiadas pelo olho
azul do céu,
vitral toldado
por nuvens,
brasa cromo
do sol posto?


                                                                Diógenes da Cunha Lima


Poeta Potiguar

PIETRO ARETINO

Pietro Aretino

Tens-me o pau na boca, o cu me vês;
vejo-te o cu tal como ele foi feito.
Dirás que do juízo sou suspeito
porque nos pés eu tenho as mãos, em vez.

Mas se em tal modo de foder tu crês,
confia em mim, assim não será feito,
porque eu na foda bem melhor me ajeito
se meu peito do teu sente a nudez.

Ao pé da letra quero-vos foder
o cu, comadre, em fúria tão daninha,
com dedo, com caralho e com mexer,

que vosso gozo nunca se definha.
Pois não sei que é dulcíssimo prazer
provar deusas, princesas ou rainhas?

                      Mas direis, escarninha,
que embora eu seja em tal mister sublime
o ter pouco caralho me deprime.


                                                                         Pietro Aretino

domingo, 1 de junho de 2014

SE TU FOSTES

Poetiza Potiguar

Se tu fostes noite, eu não
amanhecia
se tu fostes o escuro do meu
quarto nunca a luz acenderia

Mesmo se fostes pesadelo, eu
não queria acordar
se fostes águas
profundas, queria me afogar

Se fosse machucado, queria
ser a ferida
se fosse ermo queria ser
eremita

Se fostes a dor, queria sofrer
se tu fostes a morte...eu
ia...morrer!


                                                                        Angélica Fernandes




NOITE DE DEVANEIOS


Paraibano Radicado em Luiz Gomes/ RN

                   I

Ao sentir o toque da pele,
ao olhar nos olhos,
doce sentimento desperto
quando cuidadosamente
eu...
              te olho de perto.

                  II

Ao som dos ventos,
ao canto dos pássaros,
a cada momento
tua voz suave inebria
meus...
                 pensamentos.

                  III

E nesta noite de brisa suave
bebo teu corpo...
provo teus lábios...
e em tua boca me afago
pisando em simples relva
e de fronte a este lindo lago.

                  IV

Tua pele morena
meu corpo suado
não consigo desprender-te
de meus pensamentos...
não te esqueço
e deito sozinho
em meus sombrio quarto.


                                                                  Júnior Fontes