sábado, 19 de dezembro de 2015

VISÃO INFANTIL ATRAVÉS DE UM VITRAL RACHADO



Demetrios Galvão


i

o espelho punk
com seu moicano e
raízes bailarinas
equilibra-se no ar
mirando com seu olho único
a flor moinho de vento.

a borboleta-cara-de-morcego
com asas de arco-íris quebrado
vomita relâmpagos
na tempestade carnívora
do sol.

ii

fruto estrangeiro
inflamado de dentes
em suas pétalas oculares.
sacia a fome clorofilar
de suas feridas verdes.

iii

nas estrias do algodão atmosférico
um dragão invertebrado
refaz desenhos de basquiat.

iv

suruba de cores na calda-radar
do peixe metamorfo.
imagens de proveta
no reflexo insípido de um vitral  rachado.

v

na órbita da moldura
asteroides fanáticos,
rabiscos de nanquim
num piquenique insólito
(de espinhos de aço.)


                                                                           Demetrios Galvão







quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

INGRID CARRAFA



Ingrid Carrafa

Escovou os dentes até esfolar a língua
E não conseguiu tirar o gosto de sarjeta da boca
Promessas de fim de ano
vodca com coca-cola
Cantadas desgraçadas
O som está alto
ela também
sujeito nojento pergunta seu nome e faz massagem no pau
Promessas de fim de ano
perfume de mulher bem na hora do tango
Chora enquanto escreve no guardanapo
Promessas de fim de ano usadas pra limpar o rabo sujo de merda
o papel higiênico acabou
O bar está fechando
não caiu em si
Continua escrevendo promessas de fim de ano
Foder sem beijar
pra não prostituir a alma
Barganha com o diabo
Dar descarga no coração para afastar as moscas


                                                                             Ingrid Carrafa





terça-feira, 1 de dezembro de 2015

MÁRIO DA SILVEIRA



Mário da Silveira


Muitas vezes pensei que mais te amando,
Mais te querendo, só eu poderia,
Colher na seara amarga do meu dia
Um fruto doce, um lenitivo brando.

Mas hoje vejo que vivi sonhando
Um grande bem que, enfim, não existia,
Porque, se mais te via, mais eu via
Tua alma da minha alma se afastando.

Eu, que nasci sentimental e poeta,
Eu te sentia humana entre os meus braços,
Como as demais, efêmera e incompleta.

Mas, que loucura! Mas, que ledo engano!
Vendo-te imaterial pelos espaços,
Sinto-me triste, muito mais humano!

                                                                          Mário da Silveira